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quarta-feira, fevereiro 15, 2017

(NÃO) CHUTE PORQUE É MACUMBA.





Altar da Choupana do Sr. Sete Montanhas, templo de umbanda dirigido pelo meu pai.


Nasci no Rio de Janeiro, no seio de uma família religiosa, mas não nos moldes tradicionais. Durante a infância, frequentei escolinhas de evangelização kardecistas e, na pré-adolescência, acompanhando meus pais, passei a frequentar um terreiro de umbanda. Jamais fui batizada ou assisti a uma missa.

Desde a mais tenra idade, ouvia que fulana havia feito uma “macumba” para desmanchar um relacionamento; que sicrano tinha adoecido por conta de uma “macumba” de um desafeto. Isso sem contar as piadinhas, como a famosa “chuta que é macumba”.

Dentro desse contexto, apesar de ter colegas que compartilhavam dessa mesma herança familiar, sentia-me, de certo modo, constrangida de revelar abertamente a minha religião. Por esse motivo, procurava omitir o fato ou, quando questionada diretamente, dizia ser “espírita” – termo genérico que não deixava claro que eu e a minha família éramos, na verdade, adeptos de uma específica religião afro-brasileira: a umbanda.

Na adolescência, com a mente fervilhando com novas ideias e questionamentos, abandonei o terreiro e passei por uma fase extremamente cética.

O que isso tudo tem a ver com direitos humanos? Acredito que observar o comportamento de crianças e adolescentes é um efetivo meio de identificar muitos preconceitos, passados de pais para filhos e expressos no ambiente escolar sem nenhum filtro do “politicamente correto” ou da hipocrisia. E, a partir do momento em que uma criança ou adolescente se sente constrangida de afirmar suas origens (seja ela religiosa, étnica, social, geográfica etc.), algo está muito errado.

Não é à toa que hoje assistimos a uma avalanche de situações de intolerância religiosa, que somente começaram a ser (re)conhecidas pela sociedade como um todo quando os adeptos das religiões afro-brasileiras se mobilizaram para denunciar as agressões que vêm sofrendo, chamando a atenção das autoridades para essa grave violação do seu direito à liberdade religiosa.

Há cerca de uma semana, no subúrbio do Rio de Janeiro, ao sair de um culto de candomblé, a menina Kayllane Campos, de 11 anos, foi apedrejada por dois jovens, que vociferavam: “É o diabo, vai para o inferno, Jesus está voltando”. Coincidentemente (ou não), na mesma semana, também na capital fluminense, o médium Gilberto Arruda foi encontrado morto, amarrado e amordaçado, dentro do seu próprio Centro Espírita. Ela poderia ser eu; ele, o meu pai.

No âmbito jurídico, recentemente, grande polêmica surgiu em torno de uma decisão judicial em uma ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público Federal contra o Google, objetivando a retirada de vídeos hospedados no YouTube com mensagens de intolerância contra religiões afro-brasileiras. Ao fundamentá-la, indeferindo a antecipação de tutela, o magistrado afirmou que “as manifestações religiosas afro-brasileiras não se constituem em religiões, muito menos os vídeos contidos no Google refletem um sistema de crença – são de mau gosto, mas são manifestações de livre expressão de opinião”[1].

O caso é paradigmático e particularmente grave, porque – às vezes é necessário o alerta do óbvio – o Judiciário é um Poder do Estado. Ora, se o próprio Estado nega o status de religião a um conjunto de crenças e práticas que um grupo considera como tal ou, ainda, estabelece arbitrariamente uma “hierarquia de crenças”, como pode ser garantido a todos igualmente o direito à liberdade de crença consagrado no art. 5º, VI, da Constituição? É preciso que se considere com a devida seriedade que “a liberdade de religião não está restrita à proteção aos cultos e tradições e (para crenças das religiões tradicionais (Católica, Judaica e Muçulmana), não havendo sequer diferença ontológica (para efeitos constitucionais) entre religiões e seitas religiosas” [2].

Portanto, já é hora de todas as crenças gozarem do mesmo respeito e da mesma proteção, não somente no papel, mas também nas instituições e nos espaços públicos, como no Judiciário, nos presídios, nas escolas. Já é hora de se criar a consciência de que não podemos menosprezar algo simplesmente por estar relacionado a uma religião afro-brasileira. Que tal começarmos por não chutar a “macumba”?

Gabriela Japiassú Viana é Procuradora do Estado de São Paulo e colaboradora do grupo Olhares Humanos.
REFERÊNCIAS

[1] Vide notícia completa em: http://www.migalhas.com.br/Quentes/17,MI201113,21048-Juiz+diz+que+culto+afrobrasileiro+nao+e+religiao.

Fonte:https://olhareshumanos.wordpress.com/category/direito-a-liberdade-de-crenca/

Reflexão

Estou aprendendo que a maioria das pessoas não gostam de ver um sorriso nos lábios do próximo.Não suportam saber que outros são felizes... E eles não! (Mary Cely)